[RP Fechada] Silent farewell

Quando a manhã raiou, Anairë não conseguiu ouvir o canto dos pássaros, tão pouco sentiu o doce aroma de flores que sempre invadia a janela do seu quarto. Sentiu os primeiros raios de sol tocar sua pele alva deitada sobre os lençóis macios. A jovem não tinha dormido, teve tempo de presenciar a explosão de cores que a alvorada proporcionava no firmamento. A brisa aos poucos invadiu seus aposentos, balançando as cortinas finas que adornavam as imensas janelas. Seus olhos cianos percorreram todo o lugar e as parentes que antes eram alvas como nuvens, pareciam cinzas e sem graça. A morena se virou na cama mais uma vez, desejando não se levantar, não queria que aquele dia começasse, tão pouco que ele chegasse. Um suspiro profundo saiu de seus lábios e seus olhos se fecharam, em uma esperança boba que caísse no sono pelo menos por algumas horas, mas ela já não tinha mais esperanças que isso acontecesse.

Seus pés tocaram o mármore frio do piso, fazendo-a se arrepiar por completo, caminhou com passos vagarosos abrindo a porta da enorme sala de banho, que já estava preparada para ela. Mergulhou na banheira com água morna e seu olfato logo identificou o aroma das ervas calmantes. Respirou fundo, queria realmente que a infusão fizesse algum efeito sobre ela, contudo, seu coração continuava despedaçado. Não permaneceu muito tempo ali, apenas o suficiente para que seu corpo relaxasse um pouco tendo em vista a tensão dos últimos dias. Ao retornar até seu quarto, um belo vestido estava sobre a cama, não era negro, mas um tom de cinza profundamente escuro, como as rochas de Moria. Não gostava de usar negro, nem em ocasiões fúnebres como aquela, tinha a plena certeza que seus irmãos fariam isso por ela. Apenas escovou as longas madeixas negras e dispensou qualquer joia que pudesse usar, menos a tiara que havia ganhado de presente de sua mãe.

Entre os três filhos do Rei Elessar Telcontar e Arwen Undómiel, ela era que havia herdado mais traços da herança élfica que corria em seu sangue. A semelhança com a sua mãe chegava a ser assustadora. Os cabelos negros, a postura esguia e o jeito sereno na maior parte do tempo. Os olhos, todavia, eram azuis como a Senhora de Lórien, Galadriel, mas haviam outras coisas nela que também lembravam muito a bisavó. Mas apesar de ter a serenidade de sua progenitora, seus modos indubitavelmente eram os mesmos de seu pai, até mesmo a coragem para enfrentar qualquer adversidade. Foi ele quem a ensinou a manejar uma espada pela primeira vez, mas depois deixou isso por conta do capitão da guarda. Mas todos aqueles momentos bons pareciam ter chegado ao fim e se tornavam apenas lembranças que ela teria por sua vida, fosse ela longa como um elfo ou curta como a de um humano. Aquela era uma dualidade que ela teria que enfrentar e em algum momento de sua vida, fazer uma escolha.

A meio-elfo caminhou solitária pelos enormes corredores de pedra branca, passando entre os arcos de mármore que adornavam os salões do palácio. A cidadela estava deserta, provavelmente todos já estavam no pátio principal. Anairë cessou seus passos, suas pernas não queriam continuar aquele caminho, não queria se despedir dela. Ela poderia ter uma vida eterna, mesmo distante nas Terras Imortais. Haveria uma distância física, mas ela estaria lá e chegaria um dia em que eles se reencontrariam. Era um pensamento egoísta, seu pai jamais poderia chegar até lá e sua mãe jamais o deixaria para trás. Agora eles teriam a eternidade para estarem juntos se assim fosse a vontade deles. Sua mãe dizia, que um dia ela encontraria alguém que a faria entender sua escolha, mas a mais nova sempre dizia que os romances eram para Míriel e não ela. Balançou a cabeça espantando os devaneios e voltou a caminhar com passos firmes e rápidos, seu irmão deveria estar esperando por ela.

O gigantesco lugar estava todo decorado com flores brancas, algumas as favoritas de sua mãe, seu perfume se espalhava rapidamente pelo ar. Sua presença rapidamente foi notada, Eldarion deu um sorriso fraco e Míriel tinha as bochechas vermelhas: — Meu irmão. — Se aproximou para que ele beijasse a testa, um habito que tinham desde criança. Em seguida se aproximou de Míriel e ergueu seu rosto limpando as bochechas rosadas:— Nossa mãe não gostava de vê-la chorar. Acho que nós duas devemos isso a ela. — Sorriu fraco para a mais nova que tentou retribuir inutilmente. Ela usava um vestido negro, que destacava ainda mais as bochechas vermelhas e contrastava com a pele muito branca, estava visivelmente abatida. Eldarion parecia um pouco melhor, trajava uma túnica negra, calças da mesma cor e uma capa presa aos ombros. Seus cabelos estavam presos um pouco mais desleixado, não podia culpa-lo por isso.

A breve conversa foi interrompida pelo ranger estrondoso do grande portão e em seguida, a entrada do cortejo. A frente vinha Elladan, tio do trio, com suas vestes marrons e a tiara adornado a cabeça, também tinha feições abatidas e claramente não era pela viagem. O caixão foi posicionado ao centro, flores brancas estavam ao redor do corpo de sua mãe. Queria se aproximar, mas suas pernas mais uma vez impediram que ela fizesse tal caminho, apenas seus irmãos continuaram. De longe observava a cena e ao mesmo tempo suas lembranças felizes naquele mesmo lugar conflitavam umas com as outras. Era como se Mandos estivesse abraçando a ela naquele instante, um frio que tomava seu corpo, alma e coração, tornando sua pele gelada como o pico mais alto de uma montanha. Por mais que todos estivessem ali, ao seu redor, somente a solidão lhe parecia amiga, seu último raio de felicidade se apagava de uma vez por todas.

O abraço veio de forma inesperada, a salvando daquele maremoto de escuridão e dor, fazendo a jovem meio elfo suspirar: — Não pense tanto, minha querida. Isso vai enlouquece-la. Foi a escolha da sua mãe. Cabe a cada um de nós respeitar. O amor que ela e seu pai sentiam... Jamais será de nossa compreensão. Agora eles finalmente vão estar juntos, para todo o sempre. Tente encontrar conforto nisso. Assim como eu. — Disse o mais velho. Anairë se aconchegou em seus braços e peito, finalmente encontrando algum acalento: — Tio. — Balbuciou com dificuldade e segurando a túnica marrom de Elladan. Talvez todo aquele tempo, tudo que ela realmente precisava, era ter aquele abraço para afaga-la.